Amamentar é - aleitamento materno | por Chris Nicklas

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Desenvolvimento do bebê /Dr. Daniel Becker

A primeira infância e o uso de tablets e celulares

Dr Daniel Becker reflete sobre o uso destes acessórios na primeira infância e da dicas de como lidar com esse tipo de compulsão

  • 29/08/2014
  • Dr. Daniel Becker

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Voltamos ao ar depois de um longo período sem publicações. O excesso de trabalho é, felizmente, a explicação.

Recomeçamos com um tema importante, muitas vezes difícil de digerir para famílias habitantes do século XXI. E com novidades muito relevantes. O texto é longo, há muita informação, comentários e controvérsias. Vejo como uma reflexão importante, mas se você não quiser ler tudo, dê uma olhada no resumo e sugestões ao final.

Já escrevemos algumas vezes aqui sobre os riscos de telefones celulares e aparelhos semelhantes (tablets) para crianças. Pois é, a coisa anda piorando.

Os riscos mais conhecidos estão no excesso de uso e são de ordem cognitiva e psíquica: o afastamento da realidade, o desligamento do convívio e da interação, o entretenimento permanente e a incapacidade de lidar com o ócio, a perda da criatividade, redução da capacidade de concentração, a exposição à publicidade (com consequências dramáticas para as crianças).

A portabilidade tornou o mercado de vídeos, jogos e filmes / TV onipresente e 100% acessível na vida das crianças. O uso excessivo – já evoluindo para o compulsivo muitas vezes – que vem se agravando nos últimos anos, é perigoso e muito tóxico para a saúde física e mental da criança. Me angustia ver crianças de 4 anos longe do aqui-agora, mergulhados na permanente virtualidade e distração dos tablets e smartphones em restaurantes, consultórios, carros, elevadores, e até em parques, praças e passeios na natureza.

Novas doenças surgem. A chamada síndrome de “demência digital”, causada pelo uso excessivo da tecnologia e telas, tem sido relatada em crianças em idade escolar. Elas apresentam uma perda nas habilidades cognitivas e na memória. Em adolescentes, temos a FOMO (fear of missing out, ou medo de perder) – um tipo de ansiedade social que faz o jovem não se desligar da rede social nem por um minuto. Obesidade, sedentarismo, insônia, agressividade, hiperatividade e problemas de atenção já são velhos conhecidos relacionados ao excesso de telas.

Some-se a isso os problemas resultantes do uso exagerado pelos próprios pais. Essas máquinas maravilhosas, plataformas do mundo moderno – sim, sem as quais a vida é quase inconcebível menos de 10 anos (!) após seu lançamento – provocam a perda de limites entre o tempo do trabalho e o tempo do lazer e da família, e os dois últimos sempre acabam perdendo. Adultos também são sujeitos ao vício digital e à distração compulsiva, ao trocarem o convívio presencial pelas listas intermináveis de posts na timeline e vídeos sempre “imperdíveis”. Muitas vezes são escravizados pelas relações de trabalho que impõe dedicação fora das horas habituais. Os aparelhos geram uma ausência na experiência do dia a dia. Você está literalmente em outro lugar, deixando de participar da vida onde ela acontece, suas paisagens, suas relações, seus afetos. Deixando de estar com seus filhos no pouco tempo que tem para conviver com eles.

Existem também os riscos físicos, provenientes da distração. A digitação ao volante está disparando como causa de acidentes de trânsito, talvez já seja a primeira na Inglaterra. Milhares de acidentes graves ocorrem entre pedestres por causa da distração da tela do celular.

Agora estamos cada vez mais próximos da comprovação definitiva de algo que já se suspeita há anos: o dano físico e o potencial patogênico da radiação de micro-ondas emitidas pelos dispositivos sem fio, especialmente os conectados à rede celular. Creio que não interessa à grande mídia divulgar um problema que lesa seus principais anunciantes. Mas as evidências se acumulam. Acaba de ser publicado um artigo de revisão mostrando que os riscos são bastante concretos, em especial para crianças pequenas e fetos em gestação.

Uma ampla revisão de estudos, embora com dados ainda conflitantes, publicada pela Environmental Health Trust, uma respeitada organização de saúde ambiental nos EUA, em 15 de julho no Journal of Microscopy and Ultrastructure, observou associações entre este tipo de radiação e câncer.

Os autores avaliaram estudos médicos de 2009 a 2014, dados de dosimetria de radiação de celulares, documentos governamentais, manuais dos fabricantes e outras publicações. A conclusão é que crianças e fetos enfrentam um risco maior que os adultos de dano neurológico resultante da radiação emitida por dispositivos sem fio.

A taxa de absorção de radiação é maior em crianças: pelas características de seu tecido nervoso, pela proteção óssea de seu crânio ser mais fina e pelo seu menor tamanho relativo. O feto é particularmente vulnerável, e a exposição poderia resultar em degeneração da bainha de mielina protetora que envolve os neurônios, essencial para todas as suas funções. Além disso, o cérebro encontra-se em rápido crescimento nestas fases da vida, quando a exposição a fatores de risco para o câncer, como a radiação, é sempre mais perigosa.

As taxas de tumores cerebrais têm aumentado na Dinamarca, Estados Unidos e Austrália. Um recente estudo francês descobriu que pessoas com uso muito intenso enfrentam um risco mais elevado do que a média para gliomas e meningiomas; não houve associação entre tumores uso moderado do telefone celular.

Os dados ainda são controversos; alguns estudos são baseados em um pequeno número de casos. A ciência ainda não pode determinar categoricamente o vínculo do aumento de casos com telefones celulares e similares. Outros fatores, como o diagnóstico precoce (facilitado pela ressonância magnética) podem estar fazendo a incidência aumentar. Além disso, o lapso de tempo entre a exposição a um agente cancerígeno e o diagnóstico de um tumor sólido resultante pode ser de 30 anos ou mais. Precisaremos ainda de muito tempo para ter certeza da associação entre celulares na infância e tumores.

Mas vários cientistas acreditam que já há motivos de sobra para disparar o alarme e tomar precauções. Em 2011 a Organização Mundial de Saúde classificou os campos eletromagnéticos de rádio frequência como possivelmente carcinogênicos, com base no aumento do risco de glioma associado ao uso de telefones celulares. Bélgica, França, Índia, e outros governos estão elaborando legislação sobre o tema e emitindo alertas sobre o uso de dispositivos sem fio por crianças.

O uso de telefones celulares não vai diminuir: eles são cada vez mais indispensáveis e na verdade “salvam mais vidas do que jamais serão perdidas”, diz o coordenador do estudo, Dr. Lunsford. O editor da The Lancet – uma das principais revistas médicas do mundo, Richard Horton, diz: “temos de agir usando a melhor informação científica possível. Mas isso não significa que devemos esperar até que tenhamos provas 100 por cento seguras. Quando a saúde está em jogo, devemos tomar medidas para diminuir riscos, mesmo quando o conhecimento científico não é conclusivo”.

Diante disso, como pais que desejamos o melhor para nossos filhos – sua saúde em especial – o que podemos fazer? Minha sugestão é utilizar o sempre razoável princípio da precaução: se não temos certeza, melhor se precaver, se cuidar. Um inteligente dito popular diz: tudo que é demais faz mal. Evitar o exagero vai fazer bem de qualquer modo – não apenas para evitar um possível tumor ou a demência digital, mas para melhorar a qualidade das relações familiares e amizades, a qualidade de vida em geral e reduzir riscos de acidentes.

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Pra quem começou por aqui, estamos discutindo o excesso de uso de celulares e telas por crianças. Evidencias apontam que para além dos riscos já conhecidos do excesso de telas (obesidade, sedentarismo, insônia, agressividade, impulsividade, hiperatividade e problemas de atenção, perda da criatividade) somam-se novos: a “demência digital”- queda nas habilidades cognitivas e na memória de crianças, ansiedade social e agora o aumento do risco para tumores malignos.
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Então, às recomendações:
Para os telefones e outros dispositivos sem fio:
– A distância é sua amiga. Afaste a radiação de si e de seus filhos. Calcula-se que mantendo o telefone celular a 15 cm do ouvido diminuímos em milhares de vezes o risco.
– Quando ligado e não em uso, o telefone não deve ser mantido perto do corpo. O melhor lugar para um telefone celular é a bolsa ou a mochila.
– Os aparelhos devem ser mantidos longe da barriga da mulher grávida. A mãe não deve usar durante a amamentação. Uma criança que leva um celular no bolso da calça traz um risco potencial (não demonstrado, enfatizo: potencial) para a sua fertilidade. Não deixe uma adolescente colocar o telefone no sutiã. Ora, por motivos óbvios.
– Converse com crianças e adolescentes sobre como usar telefones com cuidado. Uma pesquisa do Pew Center nos EUA mostrou que 75% dos pré-adolescentes e adolescentes dormem a noite toda com o celular debaixo do travesseiro. Impensável.
– A babá eletrônica, esse aparelho inútil e invasivo do sono dos pais, não deve ser colocada no berço do bebê. Roteadores wifi devem ser mantidos fora do quarto das crianças.

Para as telas em geral:
– Limite o tempo de tela de seus filhos (e o seu). Para os menores de 2 anos, o recomendado é zero. Sabemos que isso é inviável, mas faça o possível para chegar perto.
– Para os mais velhos procure limitar o tempo a duas horas por dia. Acredite: é possível. Ofereça opções.
– Designe “momentos-sem-tela” na rotina de casa (refeições, hora de brincar com brinquedos de verdade, ler livros, contar historias, jogar);
– Designe “áreas-sem-tela”: uma boa ideia é limitar o acesso ao computador, TV e tablets às áreas comuns. TV no quarto é o veneno supremo. Para você também, aliás.

Finalmente: saia de casa. Vá com as crianças ao teatro, ao cinema, ao museu, ao show, à roda de brincadeiras. E o supremo antídoto: desfrute da natureza – parques, praças, bosques, praias, cachoeiras, florestas. Tem (quase) sempre uma perto de você neste país abençoado. Ali não há wifi, e melhor ainda se não houver sinal de celular por um tempo. Em vez de sinal, você vai ter conversa, convívio, troca de olhares, afeto, cuidado, desfrute, prazer, gelado, quentinho, abraço, beijo, brincadeira, jogos, gargalhadas, cantoria, histórias, balanço e gangorra, corrida e pulação, sujeira, bichos, fura-onda. E um tsunami de boas lembranças. São elas que ficarão na memoria afetiva de seus filhos e vão transformá-los em seres humanos melhores para si próprios e para a sociedade e o planeta onde vivem.

Crianças: já pra fora!!

Acompanhe o trabalho do Dr Daniel Becker por aqui: Pediatria Integral